Uma das evidências que mais me tem assolado o espírito ultimamente – e estou certa que a vocês também, estimados leitores, pois esta constatação é digna de assolar até as mais ilustres mentes – é a chamada “Pandemia da Pérola”.
Ora como todos nós sabemos, não há cidade, vila e quiçá até aldeia ortuguesa que não tenha um estabelecimento comercial dedicado à venda de cafeína, vulgo caf,é que não se chame “A Pérola de….” ou tout court “Pérola de…” (sendo que as reticências correspondem ao nome da localidade em questão).
De facto, ainda a semana passada tive de ir a essa localidade mítica que é a Torre da Marinha, quando de repente me deparo com algo que, no fundo, já estava (estamos todos) à espera: um café designado “A Pérola da Torre”. Mas mesmo assim creio que a Torre da Marinha ainda tem muito que aprender, encontra-se num estado ainda imberbe dado que em Almada (centro) conto num raio de menos de dois quilómetros com duas verdadeiras “pérolas”): “A Pérola de Almada” e “A Pérola do Cristo Rei”. Ora a “A Pérola do Cristo Rei” situa-se no Pragal que, a bem dizer e bem vistas as coisas, se localiza, ora deixa cá ver, em…Almada.
Ninguém se opõe a que Almada tenha cafés que sejam umas pérolas no seu serviço, mas duas pérolas em menos de cinco quilómetros? A meu ver são pérolas a mais mas quem sou eu?
Fazendo ainda uma rápida pesquisa num conhecido motor de pesquisa na Internet verifico que há todo um admirável mundo novo em torno das Pérolas para baptizar cafés: em Barcelos há a “Pérola do Neiva Lda”, em Cascais há a “Charcutaria Pérola das Fontainhas Lda” (e neste caso até se cruzam duas realidades inusitadas: a pá de porco preto com as pérolas, se isto não é marketing do melhor, não sei o que será!), passando depois para versões pop desta pedra preciosa “Café – Snack Bar Pérola”, no Sardoal. Até o Funchal já tem uma pérola -“A Pérola dos cafés”-, sendo que aqui se inova, remetendo a pérola para o café em si e não para a localidade onde este se encontra.
Não duvido que os cafés deste nosso país não sejam meritórios de tão enaltecedora designação, contudo isto leva-me a pensar que há uma crise de imaginação aquando do registo dos estabelecimentos. Quando numa rápida pesquisa encontramos algo como “A Pérola do Orvalho” (em Orvalho, concelho de Oleiros) faz-nos pensar quem foi o autor desta “jóia” de ideia.
Vanessa Limpo
in "Expresso SemMais", edição de 26 de Abril de 2008