Numa conversa com uma amiga de infância, fala-se de casamentos e claro vem à baila o de uma amiga comum que se vai casar em breve.
Às páginas tantas, vem o célebre e não menos tradicional comentário ao casamento em questão que é "só" pelo civil.
Isto é das coisas que mais irrita e confusão faz, ou uma delas, pelo menos.
Gostava de entender qual é a correlação entre casamento crível e intervenção divina.
Já sei, já sei, ateia que sou estou muito aquém da compreensão dos laços com a Fé, da relação com Ele e o Divino em geral.
"Herege" que sou e churrasco bem passado que deveria ser para muito bom católico, estou-me nas tintas para estas balelas. São balelas. Um casamento pelo civil é,a meu ver, O casamento per si.
Podemos rendilhá-lo com liturgias, orações, centenas de convivas e comida que dava para alimentar Somália e meia, mas o que conta é o papel e a assinatura.
Não critico ou julgo quem se casa pela Igreja pelo sentido que para si faz iniciar ou continuar uma vida a dois, num contexto religioso e espiritual no qual a sua Fé e filosofia de vida se inscrevem.
Fui a vários casamentos religiosos e gostei muito de lá ter estado. Não pelas flores na igreja, pelas quintas ou grinaldas. Fui por amizade e por amizade irei, com gosto, a outras cerimónias destas que amigas/os me queiram convidar. Fi-lo pelo prazer que sei ter dado pela partilha desse momento especial nas suas vidas.
A questão aqui é que, como muita gente sabe, a maior parte das pessoas que se casam pela igreja procuram tudo menos a bênção divina para encentarem um caminho novo a dois.
Muitas das vezes esse caminho já se iniciou de outras formas e quando se vai para o altar já se contam, nessa suposta nova família, mais uma ou duas pessoas. Depois, se a questão fosse a de seguir os princípios e doutrinas da igreja católica, não só não se casariam grávidas (que pessoalmente a mim não me afecta nada, pois cada um tem o direito de ter filhos quando lhe aprouver) como seriam primeiramente virgens, ou não partilhariam o tecto com os seus "futuros" cônjuges. Isto visto de forma restrita, claro.
A igreja mudou(?) e já são aceites noivas sem flores de laranjeira (ainda bem pois há outras bem mais bonitas) e considera-se importante que o casal já tenha experenciado a vida a dois para melhor compreender o que o espera para o resto da vida.
Bom, se entendem bem o que o resto da vida significa também não tenho a certeza. Mas nem quero ter, pois certezas só o Divino lá em cima e eu sou muito térreazinha. Ninguém está preparado para o resto da vida, mesmo que diga que entende, quando "dá o nó". Creio igualmente que não tem de entender. A vida não se entende, vai-se entendendo, não se nos dá uma luz (dvina ou não) ou um rasgo de hiper-consciência e maturidade naquele momento.
Acredito antes que quando se casam, as pessoas crêem (e isto sim, para mim é Fé) que aquela pessoa que amam naquele momento, seja a tal com quem desejam partilhar o resto dos seus dias. Creio na sinceridade dos votos e por isso agrada-me tanto testemunhá-los.
Não compreendo, e faz-me muita confusão é como é que se confunde, diminui ou menospreza um acto que mais que legal ou religioso, é simbólico de uma união que se quer frutuosa, com algo que, pura e simplesmente, não tem o "mesmo" valor que outro que, por se aliar a uma cerimónia litúrgica ganha imediatamente outra dimensão. Como se estivesse num plano superior.
Superior para quem? Dimensão divina? Comunhão e aceitação dos princípios de Deus?
O matrimónio foi inicialmente criado para garantir relações e /ou trocas comerciais, estatuto social e/ou económico. Na sua génese teve tudo menos a ver com espiritualidade e muito menos amor. Amor entre duas pessoas, pelo menos. Provavelmente teve muito mais a ver com interesses familiares.
Não confundamos então religião com amor ou divino com casamento.
Claro que há algo de étereo nos casamentos, espiritual, doce e encantatório. Mas, a meu ver, isso não se cruza com Deus ou a Igreja. Essa aura onírica, terna, doce e sentida tem um outro nome: Amor.
E ele sim é algo de divino.
4 comentários:
Minha kika, das melhores coisas que já escreveste!!!
E, se me permites, embora não fales disso, mas continuando na lógica do que falas, não percebo qual o problema entre o casamento de pessoas do mesmo sexo!!! O casamento é um contrato que só é válido quando feito no "civil". Curioso, não é?
Tudo o resto, quanto a mim, são balelas. Tal como dizes!
Pelo civil ou não, nada fará sentido se não houver respeito e Amor. O importante,a meu ver, é o momento em que nos entregamos, a ansiedade e principalmente o caminhar em direcção à pessoa que nos ama e ler nos olhos dessa pessoa aquilo que mil palavras não poderiam descrever nesse momento.
O Amor já é por si só uma benção... Não é preciso sermos abençoados por "Deus" nesse dia, porque já fomos abençoados por sentir...
Com papel ou sem papel, no religioso ou no civil, do mesmo sexo ou não, o importante é o dia, os dias...
Ana, que se vai casar SÓ pelo civil no dia 16!!! ;)
Vanessa, com ou sem intervenção divina, ninguém é dono de ninguém, e não há qualquer hipótese de explicarmos, racionalmente, o que faz ou não um casamento (ou uma relação semelhante) dar certo. Há pessoas casadas a vida inteira pela Igreja que não sabem com quantas linhas se cosem, que são infiéis, que não se amam. Poderão elas designar o que é um «casamento»? Ficar só por ficar é a atitude mais comum, as pessoas raramente são construtivas, só que não sabem disso. Validar o casamento com a palavra Deus e a palavra Igreja parece-me que não lacra as pessoas, não as define, e mais do que isso, não, não é uma garantia...
Hoje em dia, os casamentos fazem-se para ou outros...convidam-se determinadas pessoas apenas porque fica bem...gastam-se fortunas em prol da actividade faladora das vizinhas, no dia seguinte...casam-se pela igreja apenas por receber não a benção de Deus mas das pessoas...enfim, isto duraria horas...
Eu, com todo o respeito pelo quem o faz, não me revejo nesses dias...sou mais uma daquelas que SO casa pelo civil (brevemente alias), mas com o facto de ser uma cerimonia apenas para mim e para o meu menino...mas com mta felicidade, obrigada...
Miga, belissimo texto...
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