Numa conversa outro dia com colegas da área em que trabalho, a discussão girava em torno de casamentos, divórcios e uniões de facto.
Uma das pessoas presentes escandalizou-se quando outra se mostrou feliz pelos seus pais se terem divorciado quando ainda era criança. A seu ver, não é comum os filhos ficarem felizes com os divórcios dos pais. A que respondeu, afiança-lhe que essa terá sido a melhor decisão que alguma vez tomaram.
Esta pessoa não teve tempo de explicar à primeira que a principal razão que a levou a responder assim foi a pura convicção de que os casamentos, como qualquer outra relação, existem porque e enquanto nos fazem felizes. O maior objectivo dos pais quando se casam, tendo ou não filhos, é conseguirem criar uma relação feliz. Algo que nasce, cresce e sofre as mutações que são intrínsecas à própria condição humana e ao crescimento enquanto pessoas.
Os pais, os casais, sabem que relações felizes não são sinónimo de relações perfeitas. Essa ilusão cabe aos filhos, que não possuindo o mesmo grau de experiência de vida, constroem ideais de amor e relacionamento que os ajudam a edificar-se enquanto gente.
Os pais são heróis, as mães são perfeitas, as melhores. Os filhos amam tanto os pais que juram a pés juntos nunca se quererem casar quando forem “grandes”. O amor dos pais basta-lhes, pois, nessa altura, os pais são o (seu) mundo.
Para os pais - os que se respeitam e crêem na relação enquanto construção diária equitativa, negociação permanente e espaço de desenvolvimento interior e exterior - a tarefa mais árdua será a de manter a noção de responsabilidade que essa sua função de arquitectos tem para os seus filhos.
Os filhos, esses, crescerão, e se a lição tiver sido bem ensinada, serão os primeiros a reconhecer que se o casamento dos seus pais tiver culminado em divórcio, a decisão dessa ruptura terá sido feita a pensar naquilo que foi a sua prioridade enquanto casal e sobretudo enquanto seres humanos: a de serem felizes, de gerarem um ambiente equilibrado para os seus filhos e permitirem-lhes perceber que no amor, como na vida, há alternativas quando o fim da relação gera como resultado subtracções na felicidade e não somas.
Vanessa Limpo, in "Expresso Sem Mais", edição de 21 de Novembro de 2010.
3 comentários:
Uma das coisas mais complicadas da vida é chegarmos àquele ponto em que nos perguntamos: e agora, quais são os meus valores? E descobrir que nos nossos valores há muito dos nossos pais, mas também há muito da nossa criatividade e da nossa capacidade de adaptação, sobrevivência.
O divórcio, mais do que o casamento, é uma dessas descobertas. A tua amiga ficou surpresa pela inquestionabilidade do dado adquirido de que os casamentos duram «no matter what».
Ninguém quer ser infeliz, nem dentro nem fora de um casamento. E de um modo ou de outro, ser infeliz faz parte. Ficar ou sair exige igualmente resistência.
Eu teria sido muito mais feliz se os meus pais se tivessem divorciado? Não sei. Teria tido outra vida, certamente.
Só acho que em nada na vida podemos ter certezas ou ser fundamentalistas, ou dizer para sempre, ou dizer nunca mais. Devemos ser, como dizem os orientais, como o bambu, flexíveis, mas sem nunca quebrar...
Não haverá algo de podre em acharmos também que pode sempre haver reconciliações, que isso é o preferível, já que acalenta os sonhos românticos das pessoas? Fartei-me de ouvir isso quando me divorciei, vais ver que ainda dá, talvez voltem, ele gosta de ti e tu dele, as pessoas mudam, nunca se sabe...
Ser flexível não é apodrecer o coração e a auto-estima.
Conheço um caso bem perto de mim de alguém que pediu por favor aos pais para nunca mais se reconciliarem. E assim foi.
Eu sendo filha de pais divorciados, digo que essa foi a melhor escolha que ambos fizeram...mas digo-o agora, não aos 6 anos, quando ainda não entendia o porquê dessa decisão!
Dizia que jamais iria casar e no entanto...mas continuo a achar que não é esse contrato que dita sermos felizes ou infelizes.
Mais vale 1 vida feliz, que uma vida de aparências...
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