quarta-feira, 3 de junho de 2009

Algo desse género...





Um doente sofre de uma deformação que lhe transfigurou o rosto desde que nasceu.
Um jovem-homem-elefante.
No fim do episódio, muito ao jeito "all is well that ends well" (já dizia o William) surge o comentário bottom of line (típico em qualquer série, mas muito "sumarento" porque é esta) médico para o paciente:

Dr. House: "Take the steroids. Then you can do the surgery.
They can take away your face but not what your face has made of you." (or something quite like that).



Coming to term with ourselves. É a expressão que mais me ocorre quando penso nisto.
Neste caso foi um rosto. Uma capa. A nossa. O nosso cartão de visita.
No episódio, House tenta minimizar dizendo que a cara desfigurada não é o mais importante. O que importa é o que o jovem fará consigo mesmo (e como verá e agirá com os outros) quando se vir "normal" (como ele mesmo disse).
House sabe que o puto tem o seu (grande) quê de razão. A beleza é "interior". "Quem feio ama, bonito lhe parece", "as pessoas valem pelo o que fazem e não pela sua beleza".
Esaier said than done. Sabemos que conta, e não é pouco.
Ter um rosto minimamente aceitável, ou dito "normal" é o melhor passaporte para a aceitação por parte da sociedade.
Isto de se dizer que os feios tornam-se bonitos porque têm bom coração é muito giro mas não creio que lhes valha de muito.
É hipócrita dizer-se que não se olha para isso quando se conhece alguém. Os primeiros segundos são decisivos.
Seja para uma entrevista de emprego, ou para um qualquer encontro
Não tendo nós a visão "raio-x" do conhecido super-herói, é-nos difícil fazer uma radiografia interior. E não é porque não tenhamos a radiação ou as ferramentas certas.
É simplesmente porque não nos queremos dar ao trabalho.
Como já disse aqui, conhecer alguém, ou melhor, querer mesmo conhecer a seiva de que os Outros são feitos, dá muito mas muito trabalhinho. Pois se nem a nós mesmos queremos conhecer, quanto mais aos outros.
Conhecermo-nos é o percurso mais tortuoso que há. E isto acontece porque, geralmente, o que encontramos quando em nós viajamos nem sempre é bonito. Lá está, o que vem depois desse caminho, o que somos depois disso obriga-nos a algo que não estamos habituados: a aprendizagem da humildade. Pelos nós. Pelos outros.
Não somos todos bonzinhos, o nosso maior defeito não é apenas a teimosia (já repararam que nos inquéritos às mais variadas personalidades públicas quando se lhe é perguntado qual é o seu maior defeito, é a teimosia que impera, sozinha, no trono frio e oco da ignorância de si).
Somos muitas vezes, "feios, porcos e maus", ingratos, invejosos, melodramáticos, caricaturais (como House). Isso não nos distancia uns dos outros, aproxima-nos da nossa humanidade. É ela que nos liga, mesmo quando nos corrói.
Perdoamos quando sabemos que não perdóamos, rimos quando não achamos graça, cedemos quando sabemos que temos razão. Pedimos desculpa, tantas vezes, não porque nos sintamos assim tão culpados (senão não voltaríamos a fazer mal de novo) mas porque precisamos da absolvição dos outros para nos sentirmos aliviados.
E no meio de tudo isto, o rosto, ou o aspecto, como lhe queiram chamar, é o que fica nas retinas. É o que nutre o pensamento depois, quando a memória insiste em em devolver-nos a imagem da pessoa. E quanto mais cedo aprendermos isto, mais depressa criamos os anti-corpos necessários para sabermos lidar com os múltiplos vírus que nos infectam (ou tentam).
Se é triste? Sim. Redutor? Completamente.
Injusto? O mais possível. Mas como diria o M.D "that's life, so get used to it".
Or something like that.

1 comentário:

Anónimo disse...

Amiga as tuas palavras atingiram a luz ;)