sábado, 27 de março de 2010

Validade...

Outro dia estava à entrada de uma sala de teatro e fui levantar um bilhete para ver a peça em cartaz. Perguntaram-se era um convite, ao que respondi negativamente, em seguida perguntaram-se se eu era estudante, se estava ligada ao mundo do espectáculo e, visto que a todas as gentis perguntas eu respondia de forma negativa ainda me lançaram a pergunta que é a pièce de résistance nestes casos que é se tenho menos de 25 anos (a mística do “Cartão Jovem” a pairar no ar).
Não, não tenho a idade, pelos vistos, adequada, (qual iogurte fora de prazo), já não sou, formalmente, estudante e não pertenço a nenhum grupo ou lobby das Artes e Espectáculos, sendo que como tal não fui convidada para assistir.
Visto não preencher os pré-requisitos, não passei com distinção no exame de admissão e tive mesmo de pagar. Apenas me assistiu a Vontade, o genuíno gosto pela Arte de Talma e, pensava eu que isso bastava.
Descontamos ou queremos descontar. preços, produtos, impostos, taxas (estes últimos, nem por isso). Descontamos até no tempo. No que passamos com os que mais nos são queridos, descontamos no(s)espaço(s) pois “sai mais barato”.
E vamos assim, vida fora, com “kitchnettes”, compartimentos dentro de nós para (nos) poupar(mos).
Queremos poupar mas queremos receber. Criamos as nossas próprias leis de mercado afectivo, profissional e de lazer. Esperamos sempre algo em troca afinal não há almoços grátis e se pudermos ter o mesmo descontando um pouco mais, ninguém se importará e, quem sabe, se formos muito generosos até poderemos ser reembolsados.
Vidas reembolsadas, planos poupança e, provavelmente, muito pouca Reforma...em nós.
Volto às tábuas e ao palco. Queria apenas ver a peça. Queria tanto que nem pensei em descontos, “talões e outras complicações”. Apenas eu e a minha Vontade.
Sem reembolsos, descontos ou “vales-oferta”. Somente a gratidão de poder observar o que Outros me queriam mostrar. Sem regateios abri os cordões à minha própria bolsa de mercado. Mãos largas sem prazo de validade.

Vanessa Limpo

in "Expresso Sem Mais", edição de 27 de Março de 2010.

1 comentário:

Fernanda disse...

Fizeste bem. Arte e bom gosto não têm preço.

Gostei muito.