quarta-feira, 21 de outubro de 2009

As cerejas de Julho...

Um das melhores coisas que pode acontecer na (minha) vida e nos dias que a vestem são boas conversas. Que são como as cerejas, essas as boas, já se sabe, mas há aquelas que sabem a cereja de Julho, que está boa porque está no ponto certo da sua maturidade.
Hoje e já noutros dias, com a I. tive uma dessas conversas. A I. é jovem, e ontem ao falarmos uma vez mais, disse algo que não corresponde à maturidade que a sua (jovem) idade preconiza.
A I, disse, entre outras coisas, algo como "Não sou da minha idade". É preciso ser-se maduro para dizer isto. Sentir isto. É preciso haver chão por baixo dos nossos pés para que flua este tipo de discurso.
Gosto de pessoas com chão e gosto, sobretudo, que esse chão corresponda a um olhar centrado e humilde perante a vida. Nas muitas conversas que tenho tido ultimamente, oiço muita gente a fazer imensos planos, inundadas de certezas e projectos inquestionáveis.
Nada tenho contra planos e projectos, muito pelo o contrário. O meu próprio trabalho emerge da planificação como seu pilar. Todavia, cada vez sinto que com o passar dos anos, com a experiência que a vida nos dá (mesmo e sobretudo quando não estamos prontos para lidar com o que ela oferece) que a planificação do nosso percurso vale o que vale a planificação de uma aula: podemos estabelecer objectivos, critérios, metodologias e estratégias...no fim, a vida acontece tal como é suposto, e tal como no papel da burocracia pedagógica, os planos caem nesse outro chão que a vida para nós reserva.
Não sou fatalista. Nunca o fui. Acredito que construímos e colhemos o que semeamos. Mas sei que há muito solo incerto e areias movediças nesse trilho.
Sei que não sou o que era há dois ou três anos. Sei que não serei a mesma daqui a outros tantos. E é bom. Aprendi, com o custo que algum chão árido me ensinou, que não temos a mesma pele sempre, não sonhamos o mesmo Sonho, ou desejamos a mesma Vontade.
Aprendi que é bom organizar, conjecturar mas descobri que o(s) maiores prazeres são os inesperados. As melhores memórias têm o sabor da imprevisibilidade.
Não me custa não saber o que vem a seguir. Não me importo de mudar. Quer queira, quer não, irá sempre acontecer.
E essa é a minha única verdade, do alto da minha humildade em saber que, no fundo, sei tão pouco. Ainda bem. Significa que ainda vou conhecer, aprender muito mais.
E que, inesperadamente, em tardes de Outono regressado, colho cerejas de Julho em solo inusitado.

3 comentários:

Jaclo disse...

"En tardes de..."
Bonito.
Saludos

Angelo disse...

Bonito, indeed!

Fernanda disse...

Sempre achei que as pessoas mais felizes eram as que se adaptavam melhor à mudança e ao imprevisível. Continuo a achar.