quarta-feira, 28 de outubro de 2009

O chão que eles pisam...

Paro em locais, pessoas, sítios. Paramos todos. Em situações mais ou menos importantes, com pessoas que nos tocam ou inspiram de formas mais ou menos tocantes. O que raramente fazemos é centrarmo-nos no que estamos a fazer enquanto estamos parados com essas mesmas pessoas nesses mesmos locais.
É sempre tudo muito rápido. Demasiado rápido. E qual controlo remoto dentro de nós, seguimos para o compromisso seguinte, munidos de um “GPS” temporal, bússola interior que nos guia até à paragem seguinte.
Outro dia estava parada, a ver televisão e o meu controlo remoto (o físico e mais tangível) levou-me até um canal conhecido pelas biografias que apresenta (foi o melhor eufemismo que consegui para o designar no mais curto espaço de tempo). E, uma vez mais, o canal não me surpreendeu. E não foi, de novo, pela positiva.
Entendo a filosofia de se buscar material “luso”. Gente “nossa”. Não poderia estar mais de acordo. Entendo ainda a necessidade de se trazer à luz do ecrã televisivo os designados “famosos”, os rostos mais familiares.
Não entendo, todavia, como é que apresentar a biografia de um bailarino luso de 17 ou 18 anos se inscreve na premissa do programa. Ou da própria palavra.
Quando se escreve uma biografia pressupõe-se que o seu sujeito tenha uma história, um passado consigo. Um percurso ou carreira. Ou como gosto de pensar, que tenha “chão por baixo dos seus pés”. O bailarino tem chão por baixo dos seus mas o solo em que se move, por muito fértil que seja agora, não está ainda alicerçado, construído. A estrutura está ainda a secar das primeiras tintas. O mesmo se passa com a biografia de uma jovem actriz portuguesa que não conta mais que 25 ou 26 primaveras. A qualidade do que faz ou da entrega que assume nos papéis a que se propõe não estão em causa. Nem o seu desejado futuro sucesso profissional.
O que está aqui em causa vai para além disso. Num tempo que nos suga nos seus vórtices turvos, em que não paramos mesmo quando estamos parados, consigo entender esta política televisiva. Não se quer esperar pelo Tempo. Nem pelo amadurecimento. Das pessoas, do que fazem e representam. E sobretudo, do seu legado. Uma biografia a meu ver, assenta nisso, um legado.
Uma dádiva para os outros. Que os faça pensar. Algo difícil nos tempos que correm.
Afinal... isso leva tempo.


Vanessa Limpo

in "Expresso SemMais", edição de 24 de Outubro de 2009.

1 comentário:

Fernanda disse...

Concordo plenamente. Na verdade, poucos são aqueles que têm uma vida que dava um filme, ou seja, suficientemnete interessante para poder ser ecsrita, narrada, contada. Ao pé de uma Amália, temos todos uma vida desinteressante, para não dizer, medíocre.
Essas biografias são, do meu ponto de vista, inúteis. Mas a questão é que vivemos num tempo pós-moderno, rápido, que nos tritura e cospe. Vivemos no momento. Fazemos, por isso, a biografia do momento. Sem questionar muito, que não convém.